Bárbara Gusmão

Introdução: as bases para a construção de “Os Lusíadas”


O que é uma epopeia? É uma narrativa com assunto histórico, em que se registram poeticamente as tradições e os ideais de um grupo étnico sob a forma de aventuras de um ou de mais heróis.
Uma vigorosa confiança histórica - Portugal dos tempos das descobertas possuía essas condições: um grande tema – as viagens – e muitos heróis. Além disso, o país voltava-se com decisão para o grande empreendimento das conquistas, vencendo não apenas os oceanos, mas também os estreitos limites geográficos e culturais da Idade Média européia.



Assim, Camões centralizou-se em torno da viagem de Vasco da Gama à Índia. Mas, mais do que narrar a história desse herói, ele procurou cantar a história dos heróis de seu país.
Interessante notar que boa parte das informações utilizadas por Camões veio de sua própria experiência de navegador. Também lhe foram fundamentais textos literários e históricos.



Fontes históricas:
• as crônicas de Fernão Lopes, Duarte Galvão, Rui de Pina, com informações sobre a história de Portugal;
• as crônicas de João de Barros, que lhe forneceram dados históricos sobre as navegações portuguesas;
• e o próprio diário de bordo da viagem de Vasco da Gama.



Modelos literários:
• “A Eneida”, de Virgílio;
• “A Ilíada” e “A Odisséia”;
• “Trovas” de Garcia Rezende;
• “Os Doze da Inglaterra”, de Ferreira de Vasconcelos;



A FORMA DO POEMA

São 10 partes (intituladas de cantos). Os cantos são divididos em estrofes regulares (chamadas estâncias). São 1102 estâncias em oitava rima, distribuídas pelos 10 cantos. Todos os versos são decassílabos e quase todos são chamados de heróicos (as sílabas mais fortes são a 6ª e a 7ª sílaba).
Todas as estrofes têm o mesmo esquema de rimas: os seis primeiros versos são de rimas cruzadas (ababab) e os dois últimos de rimas emparelhadas (cc).
De acordo ainda com os modelos da tradição clássica, Camões organizou o poema da seguinte maneira:



• Proposição do assunto (estâncias 1- 3);
• Invocação às musas (Canto I, estâncias 4 – 5);
• Dedicatória a D. Sebastião (Canto I, estâncias 6 – 18);
• Narração da história as viagem de Vasco da Gama (Canto I, estância 19, até o fim do poema).
à A ação do poema aparece dividida em duas linhas narrativas:
• A ação histórica – a viagem de Vasco da Gama e fatos importantes da história de Portugal;
• A ação mitológica – a luta de Vênus (protetora dos     portugueses) e Baco (adversário desses navegantes)



ANÁLISE DO CANTO I

Proposição — (estâncias 1-3) O poeta apresenta o assunto do poema: vai cantar as façanhas guerreiras dos homens que se fizeram heróis devassando o mar, dos reis que dilataram a Fé e o Império e de todos aqueles que se tornaram imortais pelas suas obras. Afirma que vai cantar a glória do povo português. Acrescenta ainda que os feitos portugueses são mais grandiosos do que aqueles cantados nas epopeias clássicas, logo, merecem ser exaltados.
Invocação às Musas – (estâncias 4 – 5) O poeta pede inspiração ás Tágides, entidades míticas nacionais, jogando a varidade das ninfas e também com o seu espírito de gratidão ao recordar-lhes que sempre as celebram na sua poesia. É significativa a valorização do estilo épico, por comparação com o estilo lírico, pois, é mais adequado á grandeza dos feitos dos heróis que vai contar.
Dedicatória - Camões dedica a sua obra ao Rei D. Sebastião a quem louva por aquilo que ele representa para a independência de Portugal e para a dilatação do mundo cristão; louva-o ainda pela sua ilustre e cristianíssima ascendência e ainda pelo grande império de que é Rei (estrofes 6 , 7 e 8).



Segue-se uma segunda parte que constitui o apelo dirigido ao Rei: referindo-se com modéstia à sua obra, pede ao rei que a leia; na breve exposição que faz do assunto, o poeta evidencia que a sua obra não versava heróis e fatos lendários ou fantasiosos, mas sim matéria história real (estrofes 9 a 14).
Termina o seu discurso incitando o Rei a dar continuidade aos feitos gloriosos dos portugueses, combatendo os mouros e invocando depois o pedido de que leia os seus versos (estrofes 15 a 18).
• Narração – O início da narração histórica ocorre com a aramada de Vasco da Gama a caminho de Moçambique. Início “in media res”, com a história já iniciada. Ocorre o Concílio dos Deuses para julgarem o destino dos portugueses: Baco é hostil, Vênus e Marte os defendem. Marte propõe, e é aceito por Júpiter, que Mercúrio seja enviado para guiar os portugueses. Baco incita o rei da Ilha de Moçambique contra os navegantes. O Mouro verifica que os Portugueses eram Cristãos e resolve destruí-los. Quando Vasco da Gama desembarca na ilha‚ é atacado traiçoeiramente, mas com a ajuda dos marinheiros portugueses consegue vencer os mouros. Vasco da Gama prossegue a viagem até Mombaça (Quênia atualmente).



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABDALA JÚNIOR, Benjamim. Camões: épica e lírica. São Paulo: Editora Scipione, 1996.
CAMÕES, Luis de. Os Lusíadas. São Paulo: Nova Cultural, 2002.
NICOLA, José de. Literatura Portuguesa: da Idade Média a Fernando Pessoa. São Paulo: Editora Scipione, 1992.
www. Vestweb.blogspot.com. (acesso em 20 de novembro de 2012)
Bárbara Gusmão
Originário na Idade Média, tinha de início caráter religioso; depois tornou-se popular, para distração do povo. Foi Gil Vicente (1465-c. 1537) que introduziu esse tipo de teatro em Portugal. Esse Auto, classificado pelo próprio autor como um "auto de moralidade", tem como cenário um porto imaginário, onde estão ancoradas duas barcas: uma como destino o paraíso, tem como comandante um anjo; a outra, com destino ao inferno, tem como comandante o diabo, que traz consigo um companheiro. Com relação a tempo, pode-se dizer que é psicológico, uma vez que todos os personagens estão mortos, perdendo-se assim a noção do tempo.
Todas as almas, assim que se desprendem dos corpos, são obrigadas a passar por esse lugar para serem julgadas. Dependendo dos atos cometidos em vida, elas são condenadas à Barca da Glorificação ou à do Inferno. Tanto o anjo quanto o diabo podem acusar as almas, mas somente o anjo tem o poder da absolvição. Quanto ao estilo, pode-se dizer todo Auto é escrito em tom coloquial, ou seja, a linguagem aproxima-se a da fala, revelando assim a condição social das personagens, e todos o versos são Redondilhas maiores, sete sílabas poéticas.


Cenário

Um ancoradouro, no qual estão atracadas duas barcas. Todos os mortos, necessariamente, têm de passar por esta paragem, sendo julgados e condenados ou à barca da Glória ou à barca do Inferno. 


A peça tem seu início quando as almas chegam subitamente a um rio (ou braço de mar) que, forçosamente, todos os mortos terão de atravessar, não sem antes sofrerem um julgamento.
Ao que tudo indica, o cenário da peça era rudimentar, possivelmente um salão (quarto) e alguns poucos móveis e panos. A mímica tem lugar de destaque, servindo de marcação e de direcionamento da ação. 

Personagens

Diabo: condutor das almas ao Inferno, conhece muito bem cada um dos personagens que lhe cai às mãos; é zombeteiro, irônico e bom argumentador. É um juiz, que exibe às claras o lado mais recôndito dos personagens, e revelando o que cada um deles procura esconder.

Anjo: Comandante da barca do céu. Representante de Deus... 

Fidalgo: Com um manto e pajem (criado) que transporta uma cadeira de espaldas. Estes elementos simbolizam a opressão dos mais fortes, a tirania e a presunção do moço.
Onzeneiro: (Agiota) Simboliza o apego ao dinheiro, a ambição , a ganância e a usura.
Parvo: Um tolo, ingênuo. Representa a inocência e a ingenuidade. 
Sapateiro: Com avental e formas de sapateiro. Estes elementos simbolizam a exploração interesseira, da classe burguesa comercial.
Frade: Com uma Moça (Florença), uma espada, um escudo, um capacete e o seu hábito. Estes elementos representam a vida mundana do clero, e a dissolução dos seus costumes.
Alcoviteira: Com arcas de feitiços, armários de mentir, furtos alheios, jóias de seduzir, guarda-roupa de encobrir, casa movediça, estrado de cortiça, coxins e moças. Estes elementos representam a exploração interesseira dos outros, para seu próprio lucro e a sua atividade de alcoviteira ligada à prostituição.
Judeu: Com bode. Simboliza a rejeição à fé cristã, pois o bode é o símbolo do Judaísmo.
Corregedor e Procurador: Com processos, vara da Justiça e livros. Estes elementos simbolizam a magistratura.
Enforcado: Com a corda (com que fora enforcado) ao pescoço. Representa a sua vida terrena vil e corruptível.
Quatro Cavaleiros: Com a cruz de Cristo, que simboliza a fé dos cavaleiros pela religião católica.

Considerações da Equipe de Trabalho

Todos os personagens que têm como destino o inferno possuem algumas características comuns, chegam trazendo consigo objetos terrenos, representando seu apego à vida; por isso, tentam voltar. E os personagens a quem se oferece o céu são cristãos e puros. O mundo aqui ironizado pelo autor é maniqueísta: o bem e o mal; o bom e o ruim são metades de um mundo moral simplificado.
A sátira social é implacável e coloca em prática um lema, que é "rindo, corrigem-se os defeitos da sociedade". A obra tem, portanto, valor educativo muito forte. A sátira vicentina serve para nos mostrar, tocando nas feridas sociais de seu tempo, que havia um mundo melhor, em que todos eram melhores. Mas é um mundo perdido, infelizmente. Ou seja, a mensagem final, por trás dos risos, é um tanto pessimista.
Na peça, é clara a intenção do autor em expor de forma satírica e despojada os grandes vícios humanos. A forma encontrada para isso reside nos personagens, ou melhor, nas almas que se apresentam no porto em busca do transporte para o outro lado, dentro da visão católica e platônica de céu e inferno. 
No auto, o autor faz o Diabo (sujeito/protagonista) parecer-se com um vendedor, ou seja, ele conhece bem as pessoas e é um ótimo argumentador, e busca obter o maior número de objetos, ou seja, de almas. Ele age como zombeteiro e irônico em certos momentos da peça, exibindo o lado mais errado dos personagens e revelando o que cada um deles deseja esconder, seus vícios e suas fraquezas. Como competência, ele tem o poder de retrucar, argumentar e penetrar nas consciências humanas, e acaba por levar cada personagem ao ato de refletir sobre seus feitos, para que percebam que não foram bons em vida, destacando assim o Teocentrismo medieval. Interessante ressaltar também que o Diabo nunca força ninguém ao pecado, ele apenas trabalha com as atitudes das próprias pessoas.